"Eu fui abusada por tios e não entendi o que aquilo significava. Para mim era normal. E acho que minha própria família achava normal. Senti os efeitos na adolescência e me tornei frígida. Foram anos de terapia, mas meu bloqueio é tanto que nunca consegui ter um namorado", conta.J. P. A., de 32 anos, conta que foi abusado pelo padrasto. "Minha mãe descobriu e ficou com ciúme de mim, como se eu tivesse culpa. Depois de dois anos do abuso, ela se separou dele, mas nunca mais tocou no assunto. Ele me obrigava a fazer sexo oral nele quando minha mãe saía para o trabalho. Aconteceu umas quatro vezes", revela.É necessário ficar atento aos sinais - Raíssa MoraisAtenção aos sinais que eles dãoA psicóloga clínica Antônia Francisca Lima, especialista em psicologia jurídica, tem expertise no atendimento de crianças que foram vítimas de abuso sexual. A realidade do consultório mostra que o perfil das vítimas é o mesmo: crianças na fase da pré-adolescência que terminam sendo vilipendiadas pelos próprios parentes.Antônia afirma que é necessário estar atento a alguns sinais que as crianças deixam transparecer, mesmo quando elas não têm noção que sofreram algum tipo de abuso.
"O principal sinal é a mudança de comportamento. Uma criança divertida e alegre que de repente fica mais retraída, apresentando medo, como o medo de escuro e de determinadas pessoas. É um tio, um padrinho, um vizinho. É preciso conversar para entender o que está acontecendo", revela.
"As meninas são as mais afetadas. Mas os meninos também. Uma coisa que a gente sempre orienta é o respeito ao corpo da criança. As redes sociais devem ser monitoradas pelos pais. O abuso também pode ser virtual. Existe uma sexualização muito grande em determinadas redes sociais que podem ser prejudiciais. Letra e dança sexual", acrescenta.Órgãos sexuais não precisam de apelidosÉ preciso orientar as crianças de forma clara, sem apelidos como "pepeca" ou "peru". "Existe o semáforo do corpo, que é exatamente para mostrar de forma lúdica onde ela pode ser tocada. Nas partes íntimas e nos seios, por exemplo. Dizer que não é legal trocar de roupa na frente dos outros. Além disso, a educação sexual é importante. E é preciso dar nomes aos órgãos sexuais. Pênis é pênis. Vagina é vagina. Isso pode evitar muita coisa", considera a psicóloga Antônia Francisca.Os pais e os filhos devem construir uma relação de confiança para evitar este tipo de situação.
"Outra coisa importante: as crianças não podem ter segredo dos pais. O segredo é uma forma que a criança esconda o abuso de forma inconsciente. Então uma conversa clara é a maior prevenção para o abuso sexual de crianças", recomenda.Diálogo é a principal armaPara a psicóloga Joceirla Barbosa, o diálogo é a principal arma contra o abuso sexual de crianças e adolescentes. É preciso construir uma relação de amizade com os filhos e dosar o diálogo de acordo com a idade. A importância é que essa cumplicidade venha desde a primeira infância.O abuso sexual é a forma de violência que acontece dentro ou fora do ambiente doméstico, mas sem a conotação da compra de sexo.Segundo Joceirla sinais servem de alerta - Raíssa Morais
"O fenômeno consiste em uma relação adultocêntrica e marcada por uma relação desigual de poder. Pode ser o pai, responsável legal ou um desconhecido. Existe a dominação do adolescente como um objeto que dá prazer", revela Joceirla.A introspecção, vergonha excessiva, pânico e rebeldias devem ser analisados com cuidado. "Além disso, problemas psicossomáticos. Como dores de cabeça, erupções cutâneas e alterações gastrointestinais. Além disso, comportamentos sexuais. Brincadeiras de cunho sexual, palavras e desenhos das partes íntimas. É algo que já acende um alerta", aponta a psicóloga.
"É preciso ter muito diálogo. É preciso informar e buscar informações sobre o corpo de acordo com a idade. Quem são as pessoas que podem tocar no corpo da criança de três ou quatro anos? Pessoas estranhas não podem, apenas os pais. É preciso dialogar de forma acessível", determina Joceirla Barbosa.As crianças devem ser ouvidas com atenção e respeito para que elas não se sintam desacreditadas. "É preciso validar a fala da criança. Muitos relatos são de que os pais não acreditam no que elas falam. É preciso acreditar no que elas dizem e verificar. Quem são as pessoas que o meu filho tem contato? Quem é o vizinho próximo que oferece um bombom, um carinho. É preciso ter um olhar aguçado para entender os contextos", finaliza.
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